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Dora Vilela


por Euza Noronha


Maria Auxiliadora Figueiredo Vilela Santos é graduada em Letras, com especialidade em Francês. É pós-graduada em Literatura. Lecionou Francês e Português, em colégios, por vários anos, e se afastou por motivos familiares. Atualmente trabalha como tradutora de Francês. Freqüenta curso de Pintura e Desenho. Gosta de todas as artes, sobretudo de Literatura.
Nas horas vagas, dedica-se à Academia de Ginástica, à leitura e à pintura de telas.
Apresenta textos variados, principalmente poemas, no blog “Pretensos Colóquios”.
Reside em Guaratinguetá, São Paulo.


Como a literatura entrou em sua vida? Que caminhos ela percorreu até você se descobrir necessitando soltar as palavras?

Aprendi a ler e escrever muito cedo. Quando eu tinha cinco anos, minha mãe me surpreendeu lendo o jornal e pensou que fosse brincadeira. Quando foi verificar, eu já lia fluentemente e escrevia até bilhetes. Talvez eu já lesse há mais tempo. Atribuo essa precocidade a um gosto inato e ao fato de meu pai ser bibliotecário. Eu passava muito tempo na biblioteca onde ele trabalhava e já me encantava com aquele mundo dos livros. Como leitora de literatura, iniciei-me na infância, portanto. Mas, comecei a escrever, levada pela intensa compulsão de criar um universo que fugisse à lógica da minha realidade existencial. Eu traduzo hoje esse meu impulso de escrever como uma vontade de mexer com as emoções, com as idéias, gerando conflitos onde elas possam se apresentar, se efetivar. Gosto de imaginar que coloco em cena uma variedade de situações que nunca existiriam se eu não as inventasse. Isso me seduz, me faz sentir viva e co-criadora do mundo.


Sei que você é uma leitora voraz, tanto de prosa quanto de poesia. Segundo alguns críticos, a prosa brasileira está qualitativamente num nível abaixo da poesia. Você concorda com isso? Se na poesia temos um Drummond, quem na prosa estaria no mesmo nível dele?

Realmente, na poesia temos, ainda produzindo textos importantes, autores como Ferreira Gullar, Adélia Prado, Affonso Romano de Sant´Anna, Fabrício Carpinejar. Já são consagrados, pelo volume da obra e pela qualidade literária. Mas, na prosa há uma enorme diversidade de escritores do mesmo porte dos poetas, como João Ubaldo, Moacyr Scliar, Rubem Fonseca, Lygia Fagundes Telles, Nélida Piñon, Luiz Vilela, Raduan Nassar, Raimundo Carrero e muitos mais, já levados em consideração como representantes, na prosa, da época que podemos designar por Contemporânea. Julgo que o distanciamento temporal vai ser necessário para julgá-los mais profundamente, apesar de que já soube que muitos críticos não consideram válida essa questão de “distanciamento”. Li numa entrevista de Flávio Carneiro, escritor e professor da Universidade do Estado do R. de Janeiro, que a prosa ficcional do início do século XXI está “se processando” ainda e há uma gama imensa de talentos que estão surgindo. Ele talvez não destaque nenhum escritor em especial. Eu também não saberia fazê-lo.

Há um tempo atrás li um comentário seu onde dizia ter certa dificuldade com a chamada poesia alternativa. Fale um pouco disso.

Não me lembro bem o que comentei, mas vejo a poesia alternativa como uma manifestação de rebeldia momentânea, como se fosse “datada”, solta, esparsa. Ela serve para o instante histórico ou o fenômeno social em curso. Wilson Martins diz “que a poesia só será literária se nos proporciona respostas possíveis nas perspectivas da eternidade”. E não se devem levar em conta modismos ou tendências, na avaliação da arte.

Segundo Glauco Mattoso a função da arte não é abrir os olhos do leitor: é fazê-los se arregalarem. Assim sendo, você considera que a literatura tem também o objetivo de contribuir para a tomada de consciência político-social do leitor? E você vê isso na literatura contemporânea?

Penso que a função da arte ultrapassa a frase de Glauco Mattoso. Não é apenas “fazer os olhos se arregalarem” com os acontecimentos sócio-políticos momentâneos, mas ela deve abranger uma visão mais ampla do papel do homem enquanto vivente de qualquer época ou lugar. A literatura, como arte, deve ter a medida do universal e do eterno, deve levar à perplexidade e ao desejo da busca dos elementos mais essenciais dos seres humanos. Vejo no próprio Glauco Mattoso essa intenção de conscientizar os leitores para os instantes atuais. Não leio autores em que vislumbro essas tentativas apenas. É preciso que a obra avance dessa fase para o alcance do universal. Usar o texto literário apenas para passar uma ideologia, qualquer que ela seja, diminui a riqueza dele, enquanto arte. Pode haver aí uma qualidade extra-literária, talvez.

Parece que faz parte da literatura contemporânea um certo desapego à norma culta da língua portuguesa. Eu diria até que tanto escritores famosos como novos escritores tendem a não usá-la. O que você acha disto?

Na escola, aprendemos a língua padrão. È a língua materna, que, como toda língua, tem um conjunto ou uma estrutura própria que faz com que nos comuniquemos e nos entendamos. Essa língua se diferencia em língua culta ou coloquial, dependendo dos diversos locais ou situações em que a usamos. Mas, mesmo com essas diferenças, é sempre a língua padrão, aprendida e fixada nas normas gramaticais. Na escrita literária, a língua padrão se torna instrumento de comunicação dos estilos dos escritores, que podem manipulá-la, transformá-la, manuseá-la, partindo-se da suposição de que eles conhecem muito bem a língua padrão e culta. A partir do Modernismo é que essa liberdade de “mexer” nos cânones da língua se tornou evidente e atualmente os escritores se expressam concedendo mutações à própria sintaxe e à semântica da língua, sem causar a estranheza inicial “pós-modernista”.
Sinto que essa liberdade, a serviço da inventividade, é sempre bem-vinda, mas há exageros, experimentações e malabarismo lingüísticos que não me agradam.

Falando agora sobre sua produção: todos sabemos que sua produção literária é intensa e contínua. O que determina esta alta produtividade? Mais inspiração ou mais construção?

Penso que geralmente os apreciadores de literatura também costumam gostar de escrever. Leio e escrevo diariamente. Ferreira Gullar diz que cria seus poemas, a partir do “espanto”. Tenho uma postura parecida. A cada leitura que faço, me deparo com alguma coisa que me surpreende e me instiga. Então, essa surpresa, ou “espanto”, me força a refletir, na primeira fase. Em seguida, preciso expressar urgentemente o resultado dessa reflexão, em palavras escritas. E mesmo no cotidiano, minha atenção é sempre voltada para os fenômenos mais insignificantes que me provocam “sustos” e necessitam ser “escriturados”. Inspiro-me com facilidade. E escrevo quase instintivamente. Depois, faço o trabalho mais técnico, apurando o texto. Muitas vezes, escrevo muito e deixo guardado, para, mais tarde, reler, revisar, burilar. E penso, como Drummond, que não é possível se fazer poema “por encomenda”. Ou existe o relâmpago da inspiração ou o texto não sai.

Particularmente, considero a internet o melhor meio de democratização da literatura. Entretanto, sabemos existir uma certa resistência a ela por parte de alguns literatos. Na sua opinião, a Internet favorece ou avilta a arte da escrita? E quanto à difusão e hábito da leitura, acha que ela contribui favoravelmente?

Acredito que se alguém faz realmente literatura, que é arte, não importam os canais por onde ela transita. Há escritores, com livros publicados, que expõem seus textos na Internet. Não entendo como seria possível esse fato aviltar a arte. Se trocassem uma moldura maravilhosa de um quadro de Matisse por outra de menos qualidade, o quadro continuaria a expressar a arte intrínseca da tela.
Então, pelo contrário, acho que a arte_ falando da literatura_ deve ser expressa e difundida pela Internet, o que só iria contribuir para sua apreensão por um número maior de leitores.

Essa pergunta é para a Dora Vilela, blogueira. Como você vê as relações de troca processadas neste espaço? De que forma elas acrescentam à sua produção e como poderiam acrescentar ainda mais?

Aprecio imensamente as trocas processadas na comunidade blogueira, através do sistema de comentários, onde se auferem as opiniões dos leitores. Pelos comentários, que procuro responder sempre, percebo uma variedade e uma diversidade de pontos de vista, que me estimulam a criação de novos textos. O fato de ler blogs com produções distintas das minhas, como os espaços voltados para as análises sociais, políticas, por exemplo, é um ganho sempre aprazível para mim. E os blogs de poesia, que muito me atraem, já que compartilham de perto da minha vocação maior, me acrescentam em todos os sentidos.
Enfim, como já disse anteriormente, a Internet só me enriquece.

Finalizando, apesar da qualidade e da quantidade dos seus escritos, você ainda não tem um livro publicado. Alguma razão para isso?

Não acho que chegou o momento de publicar meus escritos em livro, pois julgo que eles ainda carecem de amadurecimento, já que os vejo como exercícios e treinos para alcançar minha expressão mais íntima e essencial. Contento-me em expô-los no espaço do blog, onde tento avaliar a repercussão deles nos leitores. Por isso, levo a sério minha atividade como blogueira. Ela faz parte desse amadurecimento literário que coloquei como objetivo.




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